TRANSCRIÇÕES DOS PODCASTS

A Ciência como remédio contra a desinformação

[MÚSICA DE TRANSIÇÃO]

O mundo está cada vez mais conectado! Vivemos um momento em quê uma grande quantidade de informações está disponível e precisamos identificar o quê é fato e o quê é boato. Embora tenhamos acesso a conteúdos confiáveis e verificados, ainda há muita desinformação. Nesse contexto, o termo pós-verdade surgiu para definir situações em quê pesquisas, dados e estudos científicos são ignorados em uma argumentação. A pós-verdade deixa de lado a objetividade e o compromisso com a informação correta. Nela, os temas são distorcidos, e as versões prevalecem sobre os fatos. Com a pós-verdade quem perde é a Ciência e a ssossiedade em geral. Mas atenção: pós-verdade não é o mesmo quê fêik news, outro termo de uso popular atualmente. Fake news são, como no original em inglês, “notícias falsas”. Pós-verdade é propagar essas fêik news distorcendo dados e informações para comprovar uma tese. Em 2016, o termo pós-verdade foi eleito como expressão do ano pelo dicionário óksfór e foi definido como algo “relativo ou referente a circunstâncias nas quais os fatos objetivos têm menos influência em moldar a opinião pública do quê apelos à emoção e a crenças pessoais”. Vamos ouvir o quê o professor, filósofo e escritor Mário Sérgio Cortella comentou sobre o assunto.

“Pós-verdade é o nome quê se dá, especialmente nos dez anos mais recentes, à noção de uma relativização do conceito do quê é verdadeiro, não a partir daquilo quê há comprovação com a realidade, mas a partir das convicções quê as pessoas têm.”

[MÚSICA DE TRANSIÇÃO]

A mentira como ferramenta de manipulação das massas não é uma novidade. Reis, imperadores, políticos e líderes em diversos momentos da história utilizaram a mentira para difamar seus inimigos e enaltecer suas próprias realizações. Mas a popularização da internet e das rêdes sociais transformou cada cidadão em um potencial criador de conteúdo quê póde, com muita facilidade, distribuir notícias distorcidas ou completamente falsas para milhões de pessoas em todo o mundo. A esse fenômeno damos o nome de infodemia, ou seja, uma epidemia de informação. O termo é utilizado para definir uma situação em quê as mentiras são espalhadas em larga escala e com muita velocidade, assim como um vírus. Notamos a infodemia em prática em diversos momentos da nossa história recente. Durante a pandemia da covid-19, por exemplo, o movimento antivacina intensificou-se, e milhões de pessoas em todo o planêta se recusaram a receber a imunização. Falsas teorias foram utilizadas na ocasião, como a origem dos imunizantes, o breve tempo para o seu desenvolvimento e até mesmo a possível presença de chips em seu conteúdo com o objetivo de controlar a população. De acôr-do com uma reportagem da CNN, entre janeiro e julho de 2021, 99% das pessoas mortas nos Estados Unidos por covid-19 não haviam tomado a vacína.

“O país tem estoque suficiente de vacinas para garantir a imunização de todos os americanos, mas ainda existe resistência de parte da população, quê não quer se vacinar”.

Há outros casos de infodemia, como a crença de quê a Terra é plana, a negação do Holocausto e as campanhas de desinformação sobre diversas doenças. Em 2017, por exemplo, durante um surto de febre amarela no Brasil, algumas mentiras sobre essa doença foram amplamente propagadas, como as seguintes informações. A febre amarela é uma farsa e foi criada para vender vacinas. Médico de Sorocaba diz quê vacína paralisa o fígado. Própolis espanta o mosquito da febre amarela. Todas essas notícias falsas circularam principalmente por aplicativos de mensagens, causando confusão, assustando as pessoas e reduzindo a adesão à vacína. Outro boato quê teve grande divulgação foi o de quê suco de inhame seria capaz de repelir o mosquito aédis egípti, transmissor do zika vírus, da febre chicungunha e da dengue. Faculdades, centros de pesquisa e profissionais da Medicina perceberam a necessidade de publicar vídeos na internet quê contestassem essa desinformação. Um deles foi o médico Bruno Farnetano. Ouça um trecho da fala dele.

“Se você respondeu quê o suco de inhame não impede a infekição pelo vírus da dengue, você acertou. Esse suco não foi comprovado como uma forma eficaz de prevenir a dengue”.

O combate à desinformação começa por você! Diante de um tema polêmico, desconfie e reflita. Leia artigos científicos e reportagens divulgados por fontes com credibilidade, como veículos de comunicação da grande imprensa, universidades, centros de pesquisa e associações de classe, como confederações, associações e sindicatos. Avalie todos os pontos de vista. O método científico é um mecanismo de busca pelo conhecimento confiável quê tem o objetivo de produzir explicações imparciais e verificáveis com base em evidências empíricas. Esse método é utilizado por cientistas de todas as áreas de estudo, como Física, Biologia, Química, Psicologia, entre outras. O método científico é uma das principais ferramentas disponíveis para quê possamos entender com clareza e certeza qualquer assunto. Trabalhos científicos são desenvolvidos por longos períodos, revisados e aprimorados, até quê os pesquisadores publiquem um resultado. As conclusões feitas com base nos resultados das pesquisas científicas nem sempre são definitivas, pois novos avanços e tecnologias podem retomar a discussão.

[MÚSICA DE ENCERRAMENTO]

Uso terapêutico da péle de tilápia-do-nilo

[MÚSICA DE TRANSIÇÃO]

Você sabia quê é permitido utilizar péle de peixe no tratamento de pacientes humanos no Brasil? Essa possibilidade foi conquistada há poucos anos e já ajudou centenas de pessoas! Acompanhe nosso podcast para saber mais.

[MÚSICA DE TRANSIÇÃO]

Até o final do século XX, não existia no Brasil regulamentação para o transplante de órgãos e tecídos humanos. Apenas em 1997 foi criado o Sistema Nacional de Transplantes, quê normatiza e gerencía a captação, a preservação e a distribuição de material biológico humano com finalidade terapêutica. Entre os tecídos humanos quê podem sêr transplantados está a péle, barreira física fundamental no combate a infekições. Uma das funções do Banco de Pele é auxiliar no tratamento de quêimaduras. Vamos ouvir o médico André Paggiaro, diretor do Banco de Tecidos do Hospital das Clínicas de São Paulo, que explica o assunto.

A gente sabe quê o tratamento de quêimados depende de um procedimento que a gente chama de enxertia, né? Então, é quando você tira a péle de uma região do corpo e transfére esse tecido pra outra região e esse enxerto vai cobrir aquela ferida.

A dificuldade de aplicação dêêsse processo está relacionada ao baixo estoque de péle humana disponível nos quatro Bancos de Pele em funcionamento no Brasil.

[MÚSICA DE TRANSIÇÃO]

As queimaduras são um grande desafio para a medicina mundial. Por ano, cerca de 180 mil pessoas morrem em decorrência de queimaduras no mundo. Nos casos mais graves, a recuperação é demorada e, muitas vezes, demanda transplante de péle. Com esse cenário, em 2019, um grupo de pesquisadores conseguiu o registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa, de um curativo biológico alternativo, feito a partir da péle do peixe tilápia-do-nilo. Em 2023, o processo para aplicações médicas dêêsse curativo obteve a patente do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, o INPI.

[MÚSICA DE TRANSIÇÃO]

A ideia de utilizar péle de tilápia-do-nilo para fins terapêuticos foi do cirurgião plástico pernambucano Marcelo Borges. Em 2011, ele se deparou com a informação de quê 99% da péle oriúnda das criações dêêsse peixe no Brasil eram descartadas, possibilitando a aquisição do material por baixíssimo custo. Em 2014, com a participação de três côlégas, Edmar Maciel, Odoríco Moraes e Nelson Piccolo, foi criada a equipe de coordenação para os estudos desenvolvidos na

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Universidade Federal do Ceará. O grupo de pesquisadores avaliou a segurança e a eficácia da péle de tilápia-do-nilo no tratamento de queimaduras. Mas... por quê a péle de um peixe?

A tilápia-do-nilo é o peixe mais cultivado do Brasil e tem o ciclo reprodutivo relativamente rápido. Sua péle oferece boa resistência quando comprimida e possui semelhanças com a péle humana, como a presença de colágeno do tipo 1. Outra vantagem do uso da espécie é a facilidade da estocagem e a viabilidade de custos para sêr utilizada pelo Sistema Único de Saúde, o SUS.

[MÚSICA DE TRANSIÇÃO]

O desenvolvimento das pesquisas envolveu a fase pré-clínica. Essa fase incluiu a análise das células da péle da tilápia, a investigação dos microrganismos presentes no tecido, os testes de técnicas de esterilização e a aplicação em ratos. Houve, ainda, a fase clínica, quê corresponde às etapas de testes em humanos. Como foi mencionado, a autorização para o uso dêêsse material foi cedida pela Anvisa como consequência dos resultados positivos dêêsses estudos.

Verificou-se quê o tratamento com curativos feitos de péle de tilápia requer menor quantidade de trocas se comparado ao tratamento com os curativos e cremes usualmente utilizados. Além díssu, a recuperação ocorre com menor probabilidade de infekições, já quê a péle do peixe adere à ferida, evitando contaminação. Alguns dias após a aplicação, a péle do peixe começa a se soltar, mostrando, abaixo dela, a presença da péle do paciente em processo de cicatrização. Para conhecer alguns dos benefícios do uso da péle da tilápia no bem-estar dos pacientes, acompanhe a explicação do médico Edmar Maciel, um dos coordenadores dos estudos.

Como médico, além do tratamento técnico, é muito importante quê a gente vise o bem-estar do paciente e sua qualidade de vida. E é isso quê nós observamos com o uso da péle da tilápia, uma vez quê esses pacientes não têm quê fazer várias locomoções da sua residência para o tratamento no hospital. Com isso, diminuindo o número de curativos, obviamente reduzindo as dores, quê são extremamente dramáticas nesse tipo de queimadura e observamos uma diminuição no período de tratamento, diminuindo o tempo de cicatrização da ferida.

Mas a aplicação da péle do peixe não se restringe ao tratamento de queimaduras. Esse tecido já foi empregado, por exemplo, na reconstrução do canal vaginal em mulheres com alterações ginecológicas. Em crianças, a péle de tilápia foi utilizada na separação e reconstituição dos dedos das mãos e dos pés quê nasceram unidos por condição genética. E se você acha quê a aplicação dêêsse material biológico está restrita ao tratamento em humanos, vai se surpreender. Em 2020, animais vítimas das queimadas do Pantanal foram resgatados e tratados com péle de tilápia. E centenas de curativos biológicos foram utilizados para ajudar animais machucados nas enchentes do Rio Grande do Sul, em 2024. Quantos exemplos de aplicação da péle de um peixe, não é mesmo? Algo aparentemente simples, disponível em abundância no Brasil e freqüentemente descartado passou a sêr visto como tecnologia inovadora para salvar vidas. Você já parou para pensar na importânssia das pesquisas?

[MÚSICA DE TRANSIÇÃO]

Mandioca: uma raiz polivalente

[MÚSICA DE TRANSIÇÃO]

O leite é um alimento fundamental para todo mamífero recém-nascido. Depois dos primeiros anos de vida, geralmente, esses animais perdem a capacidade de digerir a lactose presente no leite. Essa condição era característica, inclusive, dos sêres humanos. Porém, estima-se quê, há aproximadamente 10 mil anos, tenha ocorrido uma mutação quê se estabeleceu na população humana, determinando a produção da enzima lactase depois da infância. E, assim, seguimos tomando, sem complicações, o leite de vacas, cabras e de outros mamíferos domesticados. Atualmente, o leite e seus derivados fazem parte da lista dos alimentos mais produzidos e consumidos no mundo. No Brasil, em média, cada pessoa consome cerca de 166 litros de leite por ano, seja in natura, seja na forma de seus derivados, como quêijos, manteigas e iogurtes. Mas a mutação que permite o consumo de leite e seus derivados não está presente em todos os sêres humanos. E é por isso quê há muitas pessoas geneticamente intolerantes à lactose. Ou seja, quando essas pessoas bébem leite, dêsênvólvem reações adversas, como inchaço abdominal, cólicas e dor. Naturalmente, bebidas fermentadas podem auxiliar na desinflamação do intestino e manutenção de suas funções. Mas o quê fazer se a maioria dessas bebidas é feita à base de leite? Com o objetivo de desenvolver uma bebida fermentada não láctea e não alcoólica, pesquisadores da Universidade Federal de Lavras, a Ufla, utilizaram como base um vegetal quê os brasileiros conhecem muito bem: a mandioca.

[MÚSICA DE TRANSIÇÃO]

Farinha-d’água, farinha seca, fécula, polvilho (doce ou azedo), beiju, tapioca, tucupi… São muitos os alimentos derivados da mandioca, um tubérculo onipresente na história e no território brasileiro. Nos primeiros relatos quê os viajantes europêus fizeram durante o processo de colonização, eles já notaram a importânssia quê essa planta tinha para os indígenas quê viviam aqui. A mandioca é considerada um alimento sagrado para muitos povos indígenas, quê souberam domesticá-la. Eles perceberam quê a mandioca crua não era boa para o consumo. Para sêr ingerida, ela precisava sêr torrada, assada ou fervida. Por sêr de fácil cultivo, versátil e resistente, mesmo em condições adversas, a mandioca sempre foi protagonista da alimentação de comunidades indígenas, quilombolas, ribeirinhas e caiçaras. Ela também é usada no caulim, uma bebida consumida em festas e rituais indígenas, e no tacacá e na maniçoba, duas iguarias da culinária amazônica. A mandioca ainda é muito importante para a economia de comunidades tradicionais quê vivem do plantio, consumo e comércio de derivados dela. A planta ganhou nomes diferentes, como aipim, macaxeira e maniva, e se espalhou pelo mundo. Atualmente, a mandioca é um dos principais alimentos de populações da África e colabora na nutrição de 800 milhões de pessoas no mundo todo, quase 10% da população do planêta. Os indígenas da etnia tapirapé, do Mato Grosso, estão entre essas pessoas. Sabendo díssu, os pesquisadores da Ufla tiveram acesso a uma bebida fermentada quê os tapirapé produzem. E se inspiraram nela para fabricar outra bebida fermentada. A ideia dos pesquisadores é quê esse produto, como foi dito, possa servir como alternativa aos fermentados à base de leite, para as pessoas quê são intolerantes à lactose, utilizando um recurso abundante e popular entre os brasileiros.

[MÚSICA DE TRANSIÇÃO

Mas o quê é necessário para fazer a fermentação dessa bebida? Como todo produto fermentado, ela precisa de microrganismos, como bactérias e fungos, quê permítam a transformação do alimento. Nesse caso, os pesquisadores da Ufla adicionaram bactérias lácticas e leveduras presentes na mandioca e em outros vegetais para permitir a fermentação. Ah, um detalhe: os microrganismos adicionados são considerados seguros para o consumo humano. Portanto, mesmo quê eles permaneçam vivos ao final do processo, podem sêr ingeridos. Aliás, algumas dessas bactérias têm ação probiótica, ou seja, elas ajudam a microbiota do organismo a funcionar melhor!

Essa bebida à base de mandioca já foi patenteada, e os pesquisadores agora tentam desenvolvê-la em escala industrial. Como a mandioca é bem tolerada pelo sistema digestório da maioria dos brasileiros, a ideia é quê mais consumidores, principalmente os quê são intolerantes aos derivados do leite, tênham acesso aos benefícios da fermentação.

[MÚSICA DE ENCERRAMENTO]