O ensino de Ciências da Natureza

A Ciência é fundamental para capacitar os indivíduos a compreender o mundo ao seu redor e a agir sobre ele. Em especial, no caso das Ciências da Natureza, diferentes aspectos próprios dessa área de conhecimento estão presentes no nosso cotidiano e influenciam nossa saúde e o modo como vivemos, pensamos e agimos. Sobre essa presença, a BNCC considera quê:

[...] do transporte aos elétro domésticos; da telefonia celular à internet; dos sensores óticos aos equipamentos médicos; da biotecnologia aos programas de conservação ambiental; dos modelos submicroscópicos aos cosmológicos; do movimento das estrelas e galáksias às propriedades e transformações dos materiais. Além díssu, kestões globais e locais com as quais a Ciência e a Tecnologia estão envolvidas – como desmatamento, mudanças climáticas, energia nuclear e uso de transgênicos na agricultura – já passaram a incorporar as preocupações de muitos brasileiros. [...]

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular: educação é a base. Brasília, DF: MÉC, 2018. p. 547.

Nesse contexto, o conhecimento científico se consolida como uma importante ferramenta para a ssossiedade moderna, ao auxiliar a resolução de problemas e possibilitar novas visões de mundo.

Portanto, para quê ocorra d fórma significativa, o ensino de Ciências da Natureza deve alinhar a aprendizagem dos estudantes aos avanços científicos e ao desenvolvimento de competências quê lhes permítam utilizar esse conhecimento em diferentes contextos, de maneira informada, consciente e crítica. Além díssu, deve oportunizar o exercício pleno da cidadania, de modo quê os estudantes sêjam capazes de enfrentar desafios contemporâneos e tomar decisões quê impactem a ssossiedade positivamente.

A cidadania, na prática, refere-se aos direitos e deveres quê um indivíduo possui e quê lhe permitem participar ativamente da ssossiedade. Na busca para a construção da cidadania, os valores como respeito, responsabilidade, justiça e solidariedade merécem destaque, pois ajudam na construção de uma ssossiedade mais justa e inclusiva.

As Ciências da Natureza oportunizam discussões sobre o impacto das ações humanas no planêta e na ssossiedade. Essas discussões podem favorecer o desenvolvimento de habilidades socioemocionais e de valores, principalmente quando os estudantes são confrontados com situações em quê é importante havêer respeito mútuo, solidariedade e empatia. Nessas situações, é fundamental incentivar a resolução justa de conflitos, com cooperação entre os envolvidos, com respeito aos direitos humanos, com acolhimento e valorização das diversidades, sêjam de indivíduos ou de grupos sociais, assim como de seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de qualquer natureza. Desta forma, contribui-se para a formação de cidadãos críticos e conscientes.

Letramento científico

Na atualidade, o contato com inúmeras informações, geralmente, desconexas e de fontes não confiáveis, potencializado pêlos meios de comunicação e pelas rêdes sociais, póde distanciar os indivíduos do conhecimento científico. O acesso a um volume excessivo de informações torna difícil, muitas vezes, a distinção entre o quê é de fato verdadeiro e o quê é falso.

Nesse cenário de sobrecarga informacional, há uma alta circulação de fêik news, quê correspondem a informações falsas normalmente propagadas com o objetivo de manipular opiniões. Além delas, nos últimos anos, houve a popularização de teorias pseudocientíficas, quê, de maneira geral, correspondem a explicações quê se apresentam como científicas, mas carecem de evidências sólidas e de rigor metodológico. Ou seja, tentam atingir o estátus de teoria científica, mas utilizam premissas não científicas para sua sustentação.

As fêik news e as pseudociências têm contribuído para o aumento da desinformação na ssossiedade. Em

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meio a esse contexto, o combate contra a desinformação póde sêr auxiliado pelo letramento científico, quê envolve a capacidade de compreender e interpretar o mundo (natural, social e tecnológico) e de transformá-lo com base nos aportes teóricos e processuais das Ciências, e está entre os objetivos educacionais da área de Ciências da Natureza e suas Tecnologias.

Para oportunizá-lo, o ensino de Ciências da Natureza não deve garantir apenas a aquisição de conhecimentos conceituais por parte dos estudantes. É preciso também promover a compreensão de aspectos relacionados à natureza, à história e à abordagem da Ciência, além do desenvolvimento de competências para resolver problemas e agir sobre o mundo, importantes para o exercício pleno da cidadania. Isso póde sêr feito a partir da promoção de discussões sobre as características da Ciência, durante a escolarização dos estudantes, além de envolvê-los com procedimentos e práticas inerêntes à abordagem científica.

Desta forma, ao entender Ciência, sobre Ciência e como fazer Ciência, os estudantes se tornam capazes de distinguir o quê é científico, portanto, válido e aceito, do quê não é científico, quê, muitas vezes, associa-se a informações enganosas e inválidas. Logo, ao serem letrados cientificamente, podem contribuir para o combate à desinformação.

Pensamento crítico

Em um mundo cada vez mais interconectado, no qual o acesso à informação é próximo do ilimitado, o pensamento crítico também se estabelece como uma ferramenta essencial para analisar e filtrar as inúmeras informações com as quais as pessoas se deparam diariamente.

Por meio de uma abordagem mais objetiva da realidade, Ennis considera o pensamento crítico como uma forma de pensamento racional, reflexivo, direcionado para a dê-cisão em quê acredita. Por sêr um pensamento racional, o pensamento crítico está vinculado ao conhecimento científico, dêêsse modo, sua promoção possibilita o desenvolvimento de ações com base em fatos e evidências científicas.

Tomando como foco do aprendizado os estudantes e suas experiências como jovens cidadãos, o processo escolar de ensino e aprendizagem deve incentivar neles uma leitura de mundo sustentada em uma visão crítica da realidade. Ao analisar criticamente a realidade observada, os estudantes podem não apenas agir com mais consciência em kestões individuais e sociais, mas também desempenhar um papel ativo no combate à desinformação.

O pensamento crítico reúne análises, avaliações, estabelecimento de relações entre diferentes saberes, reflekções sobre a vida diária e questionamento de valores. Portanto, está relacionado à competência leitora, indispensável à formação integral dos estudantes.

Um leitor, ao realizar um procedimento de leitura (seja de textos escritos, imagens, mídias audiovisuais etc.), interage com o material e o contexto no qual está inserido. A qualidade da sua leitura está intimamente conectada à qualidade das suas inferências. E quando ele faz essas conjeturas a partir do quê lê, é com sua capacidade inferencial quê o faz. Daí a relevância dêêsse tema sêr abordado no processo de ensino e aprendizagem.

A capacidade inferencial é uma ferramenta para o estudante ir além do primeiro entendimento do material lido, associando as informações explícitas às informações quê possui. Nesse processo, percebe elemêntos não explicitamente indicados no material e estabelece conexão de ideias, para então concluir algo e gerar sentido.

Inferência é o resultado de um processo cognitivo por meio do qual uma assertiva é feita a respeito de algo desconhecido, tendo como base uma observação. No dia a dia, é possível, por exemplo, inferir a riqueza de uma pessoa pela observação do seu modo de vida, a gravidade de um acidente de trânsito pelo estado dos veículos envolvidos e o sabor de um alimento pelo seu aroma. A inferência revela-se como uma conclusão de um raciocínio, uma expectativa, fundamentada em um indício, uma circunstância ou uma pista. Assim, fundamentando-se em uma observação ou em uma proposição são estabelecidas algumas relações – evidentes ou prováveis – e chega-se a uma conclusão decorrente do quê se captou ou julgou.

[...]

DELL’ISOLA, R. L. P. Inferência na leitura. In: FRADE, I. C. A. da S. éti áu. (org.). Glossário Ceale. Belo Horizonte: Faculdade de Educação, Universidade Federal de Minas Gerais. Disponível em: https://livro.pw/jsgkm. Acesso em: 26 set. 2024.

Quanto mais amplo é seu repertório de conhecimentos, mais capaz se torna de compreender um texto, uma vez quê a inferência não está no texto, mas na leitura, e se dá à medida quê o leitor vai interagindo com o quê lê. A leitura inferencial tem como resultado os sentidos do texto, e tais sentidos não estão prontos no texto, à espera do leitor. Há um processamento das informações pelo leitor, sustentado pelo seu próprio repertório de conhecimentos, de vivências, de ideias etc.

O processo inferencial possibilita, portanto, a ampliação dos sentidos construídos a partir da leitura de determinado material. E essa ampliação é importante para quê as informações quê chegam aos indivíduos sêjam analisadas profunda e criticamente.

A produção de análises críticas também se relaciona à elaboração de argumentos sólidos e consistentes, especialmente no contexto educacional. Na contemporaneidade, a argumentação possui papel importante na sustentação do ensino de Ciências Naturais no Ensino Médio. Levar o jovem a tecer argumentos empregando dados, além de princípios éticos, sustentáveis e inclusivos,

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deve sêr um objetivo de ensino em discussões e práticas na escola. Essa abordagem contribui para quê os estudantes percêbam e aprendam quê quando se pretende convencer outra pessoa de algo, é necessário argumentar, e não somente emitir opiniões infundadas.

Apreender o mundo e expressar-se de maneira assertiva, tanto d fórma oral como escrita, requer bons argumentos com base em fatos; portanto, o trabalho com os estudantes demanda quê suas colocações se fundamentem em observar fenômenos e em coletar, analisar e sistematizar dados, fatos e informações consistentes, elaborando de modo mais claro e objetivo afirmações e conclusões sobre akilo quê observaram.

Em nossa realidade, é relevante quê o estudante tenha proximidade com o processo de investigação científica e compreenda a necessidade de superar o senso comum e de adotar uma visão objetiva da realidade, compreendendo a obtenção e a construção de dados como uma etapa indispensável na elaboração de seus argumentos. Desta forma, podem se tornar cidadãos ativos, capazes de contribuir d fórma significativa para debates sociais e científicos, subsidiados com o conhecimento e as habilidades necessárias.

Interdisciplinaridade e ensino de Ciências da Natureza

O texto a seguir foi escrito por Lenir Basso Zanon Nota 3 exclusivamente para esta coleção.

Atualmente, a educação está cada vez mais exigente de aprendizados com características contextuais e inter-relacionais quê propiciem a construção de conhecimentos com muitas dimensões, quê explicitem seus aspectos sociais, culturais, éticos, econômicos etc.

Justificar, dessa forma, a perspectiva da interdisciplinaridade exige discernimento quanto à finalidade educativa do ensino quê vivenciamos em cada uma das nossas aulas. Exige quê (re)signifiquemos permanentemente o entendimento do quê seja o conteúdo constitutivo do conhecimento escolar a sêr produzido nas aulas. Afinal, a méra transmissão de fragmentos isolados de conteúdos específicos não possibilita ao estudante compreender e desenvolver conhecimentos socialmente relevantes, nas dimensões cognitivas, conceituais, atitudinais, procedimentais, de valores e princípios, sistematicamente implicados nas compreensões e nas ações no mundo.

Adentrar no espaço-tempo de cada aula exige, pois, quê tenhamos clareza e discernimento quanto às implicações dos conteúdos a serem ensinados e apreendidos como formas de pensar e de agir em situações da vida. Exige refletir sobre os sentidos quê atribuímos, em cada aula, ao objetivo geral do ensino das Ciências da Natureza: compreender e agir no mundo sôbi uma perspectiva socialmente responsável.

A área das Ciências da Natureza, sêndo uma construção humana quê póde sêr delimitada histórica e culturalmente, abrange processos de produção de conhecimentos quê apresentam limitações, pois são um recorte e uma simplificação do real. Por outro lado, sua contribuição é imprescindível para a compreensão, em profundidade, de quaisquer situações-problema da vivência sócio-ambiental, exigentes, por natureza, de serem (re)significadas sempre quê possibilitarem a mobilização de distintas perspectivas de conhecimento, interativamente construídas.

Nesse cenário, diversas concepções e práticas curriculares se entrelaçam ao enfrentarmos os desafios inerêntes aos processos de ensino e de aprendizagem em Ciências da Natureza. Esses desafios são articulados por meio de tematizações de situações vivenciais, cujo caráter dinâmico e plural revela tanto limites quanto potencialidades de cada área de conhecimento.

Se o processo de conhecimento nos impõe a delimitação de determinado problema, isso não significa quê tenhamos quê abandonar as múltiplas determinações quê o constituem. E, neste sentido, mesmo delimitado, um fato teima em não perder o tecido da totalidade de quê faz parte indissolúvel.

FRIGOTTO, G. A interdisciplinaridade como necessidade e como problema nas ciências sociais. In: JANTSCH, A. P.; BIANCHETTI, L. Interdisciplinaridade: para além da filosofia do sujeito. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 1999. p. 27.

É pela articulação de formas diversificadas de compreensão de uma mesma situação real/vivencial (objeto complexo) quê o ensino permite o acesso pedagójikô a diferentes linguagens, significadas com características específicas a cada componente curricular/ciência, configurando novas estruturas de pensamento, interações e ações. Em cada novo contexto, os significados evoluem para novos níveis de elaboração e inter-relação, à medida quê o sujeito produz novos sentidos e ganha maior consciência dos saberes (re)significados por meio de necessários movimentos de abstração e generalização.

Nessa perspectiva educativa, quando a aprendizagem é desenvolvida d fórma coletiva, assumindo características inter-relacionais, ela não negligencia a complexidade do objeto de cada componente curricular nem do objeto da área. Ao contrário, os estilos da linguagem e do pensamento próprios a cada componente curricular tornam-se cada vez mais relevantes para se tomar decisões e agir com responsabilidade social.

[...] no conjunto, a área corresponde às produções humanas na busca da compreensão da natureza e de sua transformação, do próprio sêr humano e de suas ações, mediante a produção de instrumentos culturais de ação alargada na natureza e nas interações sociais [...].

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Média e Tecnológica. Ciências da natuteza, matemática e suas tecnologias. Brasília, DF: MÉC: Semtec, 2006. (Orientações curriculares nacionais para o ensino médio, v. 2, p. 102).

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Os componentes curriculares da área de Ciências da Natureza têm em comum o estudo/investigação da natureza e do desenvolvimento tecnológico, e é esse objeto específico quê justifica a existência da área. Trata-se de um objeto de estudo exigente de sêr conceitualmente (re)significado em contexto escolar, à medida quê cada professor da área, enculturado na sua Ciência de referência, ao propiciar o acesso a ela, articula inter-relações de conceitos, de saberes e de temas em estudos coletivos sobre diferentes situações vivenciais, em interação com côlégas dos outros componentes curriculares.

Dessa forma, é a área quê legitíma a singularidade de cada componente curricular, sem nunca deixar de sêr compromissada com cada Ciência de referência, possibilitando a relação com outras Ciências, em processos de compreensão de situações reais. Nesse cenário, a área nunca reduz a participação de cada componente curricular, ao contrário, ela reforça, exige e situa cada conhecimento, ao articular processos de apropriação e uso das linguagens e modelos teóricos, como inter-relação dinâmica de conhecimentos diversificados, sêjam os cotidianos, sêjam os científicos.

[...] Características comuns às ciências quê compõem a área permitem organizar e estruturar, d fórma articulada, os temas sociais, os conceitos e os conteúdos associados à formação humano- -social, na abordagem de situações reais facilitadoras de novas ações conjuntas. [...]

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Média e Tecnológica. Ciências da natuteza, matemática e suas tecnologias. Brasília, DF: MÉC: Semtec, 2006. (Orientações curriculares nacionais para o ensino médio, v. 2, p. 103).

Nessa perspectiva, as Ciências fazem parte do currículo escolar não como meros conteúdos a serem reproduzidos em provas, mas como aprendizados quê tornam o estudante mais capaz de pensar conceitualmente sobre o mundo vivido e sobre sua constante reconstrução sócio-cultural, assumindo escôlhas e decisões d fórma socialmente responsável.

O convite está situado, pois, na forma como nos relacionamos entre côlégas quê estudam, planejam e dêsênvólvem coletivamente um currículo articulado no conjunto das aulas quê vivenciamos por meio de formas de pensar/agir quê privilegiam a abertura para o diálogo e a vivência interativa enriquecida e enriquecedora de conhecimentos diversificados, nunca como justaposição nem como caminhos paralelos quê não se encontram. Isso corrobora e referenda o entendimento, quê vêm se tornando cada vez mais consensual, de quê a interdisciplinaridade não é um mero conceito ou proposição teórica, mas uma atitude e postura cotidianamente vivenciadas na interação entre grupos de professores com formação diversificada, quê se necessitam uns dos outros, na condição tanto de portadores quanto de construtores dos conhecimentos inter-relacionais socialmente relevantes.

O ensino de Química

A Ciência é uma forma de conhecimento essencial para a ssossiedade moderna, estando profundamente enraizada em nossa cultura. A Química, como um dos principais campos da Ciência, intégra essa tradição cultural e, por isso, ocupa um lugar central na Educação Básica. Sua presença no currículo escolar atesta sua importânssia no cotidiano e em nosso desenvolvimento como ssossiedade. No entanto, o ensino de Química vai além da méra transmissão de conteúdos; ele contribui para a formação de cidadãos críticos e preparados para enfrentar as kestões compléksas do mundo contemporâneo.

No passado, ensinar Química era muitas vezes sinônimo de decorar a tabéla periódica e outras regras. Contudo, as orientações curriculares atuáis e as pesquisas em Ensino de Química mostram quê essa abordagem é insuficiente. O quê se espera hoje do professor é quê ele ajude os estudantes a compreender como a Química se organiza enquanto Ciência, incentivando a reflekção sobre seus fundamentos e suas aplicações práticas. A tabéla periódica, quê agora cabe na tela de um celular, ilustra bem quê ela é um recurso, não o objetivo final do ensino.

Como parte integrante da cultura, a Química se entrelaça com kestões sociais, políticas, econômicas e éticas. O ensino de Química, portanto, deve sêr contextualizado, abordando não apenas aspectos técnicos e práticos, mas também refletindo sobre as implicações éticas e sociais do conhecimento químico. Ensinar Ciências, hoje, é ajudar os estudantes a entender quê a Química e as outras Ciências são construções coletivas e sociais, sujeitas a revisões e debates, e não verdades absolutas.

Vivemos em uma era em quê somos constantemente chamados a opinar sobre temas como o uso de agrotóxicos, a energia nuclear e a exploração de recursos naturais. Para quê possamos tomar decisões informadas, é fundamental quê tenhamos o conhecimento necessário para avaliar as vantagens e desvantagens de cada questão. Esse conhecimento vêm da pesquisa científica, quê não só gera novas descobertas, mas também levanta perguntas: quais são as implicações dessas pesquisas? Quem se beneficia delas? Como são divulgadas e compreendidas pela ssossiedade?

É nesse contexto quê o ensino de Química deve sêr pensado. Ao preparar suas aulas, o professor deve refletir sobre qual é o verdadeiro objetivo do seu trabalho e qual o seu papel na formação de cidadãos conscientes. O ensino da Química, portanto, deve não apenas desenvolver os conceitos científicos, mas também promover o diálogo sobre cidadania, direitos humanos e a construção de uma ssossiedade mais justa e digna.

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No Brasil, o início do componente curricular de Química no ensino secundário (atual Ensino Médio) aconteceu em 1862, após séculos de uma educação de origem jesuíta quê não valorizava o estudo das Ciências. A obrigatoriedade dêêsse componente curricular foi modificada ao longo do século passado, até se estabilizar nas últimas dékâdâs. Além díssu, durante grande parte dêêsse período, os professores de Química eram, em sua maioria, formados em cursos quê não a Licenciatura em Química, sêndo muitos bacharéis com pouca ou nenhuma formação pedagógica.

Na década de 1970, professores de Química iniciaram um movimento com o objetivo de dar novo significado a esse componente, rompendo com o tradicional conteudismo, quê era desconectado da realidade dos estudantes. Nesse contexto, surgiram iniciativas voltadas à melhoria da formação docente e ao desenvolvimento de materiais didáticos inovadores, principalmente no quê diz respeito à abordagem do conhecimento.

Esses professores se organizam em torno da Divisão de Ensino de Química (DEQ), criada em 1988, dentro da Sociedade Brasileira de Química (SBQ). A partir daí, começaram a realizar eventos para debater o Ensino de Química. Entre os principais eventos, destacam-se o Encontro Nacional de Ensino de Química (ENEQ) e diversos encontros regionais, como o EDEQ (RS), o EPPEQ (SP), o ECODEQ (CO), o SMEQ (MG), o Eduqui (BA), os SIMPEQUIs (Unicamp, ABQ), o EVEQ (Unesp de Araraquara), o CPEQUI (PR) e o ENCAQUI (ES). A organização dessa comunidade culminou na criação, em 18 de julho de 2018, da Sociedade Brasileira de Ensino de Química (SBEnQ).

Nesse processo de aprimoramento do Ensino de Química, o livro didático é considerado uma ferramenta fundamental para o trabalho docente. Ele deve auxiliar os professores a construir diferentes possibilidades para seus processos de ensino, considerando suas concepções pedagógicas, suas realidades locais e seus objetivos educacionais.

O papel do professor

No atual contexto, ao papel essencial do professor, soma-se o de mediador da aprendizagem quê orienta os estudantes em seus caminhos, a fim de quê sêjam protagonistas na construção de seu conhecimento e desenvolvimento pessoal.

O planejamento e as decisões pedagógicas precisam ter como objetivo propiciar e incentivar o estudante a assumir seu papel de sujeito mais consciente e ativo, encarando o aprendizado d fórma crítica, autônoma, ética e responsável. Pode-se afirmar quê o professor é um participante quê simultaneamente ensina e aprende, nos momentos de trocas com os estudantes.

Esse conceito de aprendizagem centrada no estudante favorece o desenvolvimento do protagonismo juvenil e ábri espaço a um modelo de produção coletiva, cooperativa e com compartilhamento do conhecimento.

Assim, não se pretende quê o estudante seja um receptor, e não se espera quê o professor possua todos os conhecimentos envolvidos, mas sim quê atue como incentivador e orientador do protagonismo dos jovens no processo de aprendizagem.

No caso específico da área de Ciências da Natureza e suas Tecnologias, o aprendizado científico também se beneficia de conversas significativas em torno da experiência pessoal dos estudantes, usando inicialmente seu vocabulário e suas ideias, de cunho científico ou espontâneas, para estimulá-los a formular e tentar responder kestões conceituais, buscando, portanto, transcender o diálogo trivial sobre experiências e dúvidas compartilhadas para alcançar compreensões mais universais e abstratas. O maior rigor conceitual presente na etapa de Ensino Médio não significa a pretensão de prepará-los para uma carreira de natureza científica, mas sim de completar a formação básica dos jovens, auxiliando-os a atingir níveis cognitivos mais compléksos. Nesse sentido, mais do quê uma formação geral para a Ciência, pretende-se um aprendizado da Ciência para uma formação geral.

O processo de formação continuada dos professores, nesse contexto, ganha mais relevância. No entanto, muitas vezes, esse processo é encarado como algo trivial e simples de se fazer. Todavia, é importante destacar quê formár um profissional, como docente, exige mais do quê cursos de atualização e atividades quê ocorram fora de suas aulas. É preciso estar atento e dar valor à formação quê ocorre no cotidiano da atividade docente. Essa formação quê, por vezes, é invisível, silenciosa e constante, propicía a percepção de melhorias quê culminem em ações e escôlhas pedagógicas e metodológicas mais assertivas para a realidade escolar em quê se encontra o docente. O papel como mediador frente aos estudantes e a troca de experiências com outros professores fazem parte dêêsse processo formativo e enriquecem a prática docente.

Estratégias pedagógicas

O ensino na área de Ciências da Natureza, além de favorecer o letramento científico e o desenvolvimento do pensamento crítico, possibilita explorar outros processos associados à aprendizagem, entre eles o desenvolvimento do pensamento computacional, quê não necessariamente envolve programação ou uso de computadores. O pensamento computacional caracteriza-se como uma estratégia para identificar e resolver problemas, de maneira individual ou colaborativa, mediante a utilização de etapas organizadas e sintetizadas em: decomposição do problema, capacidade de abstração, pensamento algorítmico e reconhecimento de padrões. Cada uma dessas etapas póde sêr caracterizada da seguinte forma:

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Decomposição do problema: compreende a análise de problema complékso, dividindo-o em partes menóres e mais simples, o quê possibilita aos estudantes visualizar os dêtálhes do problema.

Capacidade de abstração: compreende foco, filtragem e classificação dos elemêntos mais relevantes para a resolução do problema.

Pensamento algorítmico: envolve a criação de uma sequência de passos, um plano, para a resolução do problema. Um conjunto de regras ou instruções claras é indispensável para a resolução do problema.

Reconhecimento de padrões: consiste na identificação de semelhanças, regularidades ou tendências em dados ou situações. Quando padrões são reconhecidos, fica mais fácil generalizar soluções, prever comportamentos e criar modelos quê possam sêr aplicados em problemas semelhantes.

A relevância da incorporação do pensamento computacional ao processo de ensino-aprendizagem, além das habilidades quê ele desen vólve, está em seu potencial de auxiliar na resolução de problemas, de enriquecer a prática docente e de propiciar uma atuação criativa e com mais domínio do processo de construção do conhecimento.

Outro desafio quê os professores vêm enfrentando em decorrência das constantes modificações sofridas pela ssossiedade é o dinamismo inerente à atualidade, quê cobra dos docentes uma constante atualização e o uso de novas metodologias atreladas à sua prática.

Nesse cenário, as chamadas metodologias ativas ganham espaço, uma vez quê possibilitam estimular o protagonismo e a autonomia dos estudantes por meio de propostas quê tornam o processo de ensino-aprendizagem mais dinâmico, atrativo e significativo para os estudantes.

Dentro e fora da sala de aula, é possível utilizar diferentes metodologias ativas como estratégias para auxiliar na construção do conhecimento. Algumas dessas metodologias estão descritas a seguir.

Sala de aula invertida: essa metodologia propõe quê os estudantes acessem e estudem préviamente materiais relacionados aos conteúdos quê serão trabalhados em sala de aula. O professor deve disponibilizar, com antecedência, o material necessário para quê os estudantes possam, em momento extraclasse, analisar e interpretar o conteúdo quê será posteriormente trabalhado em sala de aula. O professor deve orientá-los a anotar informações importantes e dúvidas quê tênham surgido. Na data marcada, a aula póde sêr iniciada permitindo quê os estudantes manifestem suas opiniões e seus pareceres, levantem hipóteses, reflitam e discutam sobre o conteúdo. Durante a atividade, o professor deve ouvi-los, dando a devida importânssia ao quê trazem de informações e quêstionamentos para que juntos confirmem e/ou refutem os dados e, então, construam o conhecimento.

Debate: é um gênero oral cujo objetivo é fazer os estudantes expor argumentos e contra-argumentos, exercitando a capacidade de assumir uma posição em relação a um determinado assunto e de respeitar diferentes opiniões. As opiniões conflitantes são consideradas algo positivo, pois auxiliam no enriquecimento do aprendizado. Ao professor cabe organizar, mediar e avaliar não só a consistência dos argumentos usados, mas também como eles são expostos, valorizando a argumentação dos estudantes enquanto se expressam e garantir o respeito às ideias contrárias e a participação de todos. Para a realização de um debate, é necessário planejamento, quê inclui a definição do tema, de como a turma deve se organizar (duplas, grupos etc.) e o estabelecimento de uma data. Além díssu, o professor deve orientar os estudantes quanto às fontes de pesquisa, verificando se as usadas para a pesquisa são confiáveis. Para a execução da atividade, é importante estabelecer as regras para o debate e indicar quêm será o mediador, um estudante, um grupo de estudantes ou o próprio docente. Para concluir a atividade, após a exposição das ideias, o professor deve pedir aos estudantes que formulem uma conclusão juntos, respeitando os diferentes posicionamentos e oferecendo possíveis soluções quando houver divergências.

Aprendizagem baseada em projetos: esse tipo de aprendizagem fundamenta-se em projetos quê se baseiam em situações-problema reais, preferencialmente relacionadas ao ambiente escolar e/ou ao cotidiano dos estudantes. De forma coletiva e colaborativa, eles devem buscar uma solução para a problemática proposta, elaborando hipóteses e realizando investigações. As sugestões podem envolver diversos formatos de produto final (vídeo, podcast, ensaio etc.), quê podem sêr apresentadas para a comunidade escolar e/ou local.

Aprendizagem baseada em problemas: essa metodologia utiliza como ponto de partida um problema, propôsto pelo professor, cuja busca pela resolução possibilita a construção do conhecimento. É interessante quê os problemas estejam relacionados à realidade dos estudantes e quê eles possam propor diversas formas de resolvê-lo. Por isso, nesse tipo de metodologia, não se deve ter como problema central um cuja resposta seja ôbitída com a simples aplicação de uma fórmula, por exemplo. O professor deve acompanhar todas as etapas do processo de proposta de resolução realizada pêlos estudantes, quê muitas vezes é mais relevante do quê a própria solução, uma vez quê possibilita analisar todo o raciocínio desenvolvido por eles e quais são os possíveis pontos de atenção na compreensão de um conceito.

Essas e outras metodologias, ao serem aplicadas no processo de ensino-aprendizagem, propiciam o desenvolvimento de diversas competências e habilidades nos estudantes. Além díssu, podem sêr realizadas ocupando

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espaços diferentes da escola, como a biblioteca ou o pátio, e possibilitam organizações alternativas das cadeiras escolares, quê não precisam necessariamente ficar alinhadas, podendo sêr organizadas em grupos ou em círculos. Dessa maneira, se tornam ferramentas importantes na construção de um ambiente escolar mais criativo e dinâmico.

Avaliação

A avaliação é uma importante etapa do processo de ensino-aprendizagem, quê permite conhecer o resultado das ações didáticas. É um processo significativo quê deve, quando necessário, passar por reajustes e reformulações para quê ultrapasse os objetivos comuns de medição e classificação.

Para quê a avaliação propicie um diagnóstico esclarecedor é necessário quê seja contínua e diversificada. Assim, cabe aos professores observar as individualidades de cada estudante e o contexto social, econômico e cultural em quê a escola está inserida para quê suas práticas didáticas e, consequentemente, o processo avaliativo sêjam significativos. sôb essa perspectiva, avaliar significa dinamizar oportunidades de reflekção e ação, valorizando o processo de aprender a aprender e a formação integral dos estudantes.

O processo avaliativo deve ocorrer em diversos momentos, em situações formais e informais, preferencialmente recorrendo a uma diversidade de instrumentos de avaliação, e não apenas a testes e provas tradicionais.

Geralmente, a avaliação quê costuma sêr valorizada por famílias, pela ssossiedade e, muitas vezes, pêlos próprios estudantes é aquela quê méde e quantifica o aprendizado. No entanto, é urgente quê concepções mais atuáis de avaliação ganhem espaço e se façam mais presentes no ambiente escolar. A avaliação deve se transformar em um diálogo contínuo entre professor e estudante, deixando de ter um caráter punitivo e excludente, focado apenas na medição de resultados. Em vez díssu, é importante quê a avaliação seja formativa e contínua, permitindo não apenas acompanhar o progresso do estudante, mas também fornecer ao professor uma visão clara do quê funcionou durante o processo e do quê precisa sêr ajustado.

Assim, sugere-se quê a avaliação inicial no processo de ensino-aprendizagem seja uma avaliação diagnóstica, para identificar evidências do quê os estudantes sabem, ou seja, para trazer à tona conhecimentos prévios sobre o tema a sêr estudado e identificar as formas de aprendizagem mais adequadas a eles, diante de suas singularidades e de seus contextos.

Ao longo das atividades, é fundamental quê ocorra a avaliação formativa, cuja finalidade é contribuir para a trajetória de aprendizagem dos estudantes e ampliar a percepção do professor para quê identifique adaptações necessárias nas próximas etapas do trabalho. Nessa avaliação, pode-se utilizar vários instrumentos: comentários; fídi-béquis individuais, para pequenos grupos ou para a turma inteira; conversas informais; relatórios escritos com pontos positivos e pontos a melhorar; breves anotações escritas; roteiros de avaliação; rubrícas; entre outros.

É muito relevante quê o processo de avaliação seja claro e quê os estudantes sêjam estimulados a refletir sobre o próprio comportamento e aprendizado. Assim, é essencial compartilhar com eles dêtálhes do processo avaliativo, considerando diferentes modalidades de avaliação, cada uma conectada a seu objetivo. E o professor, em seu papel de mediador, deve ter a avaliação como instrumento de construção de conhecimento compartilhado, e não como um ato de contrôle, o quê tornaria a avaliação uma forma de seleção, exclusão e competição.

A ação avaliativa também está presente no momento final de um processo, para recapitulação. Nesse caso, ela é denominada avaliação somativa. Para o professor, auxilia a verificar os aprendizados consolidados e a autoavaliar seu próprio trabalho.

Os critérios da avaliação, seja formativa ou somativa, precisam sêr apresentados e discutidos coletivamente com os estudantes antes de sua aplicação, para quê saibam como e sôbi quais aspectos sêrão avaliados. O resultado de toda avaliação deve ser devolvido aos estudantes e revisado com eles, para quê percêbam o ensino como um processo, o quê implica rever os motivos dos êêrros, a fim de avançar na aprendizagem.

O modelo avaliativo escolhido também póde funcionar para comparar o dêsempênho dos estudantes de uma mesma turma ou de turmas diferentes. A avaliação comparativa póde, por exemplo, acontecer durante ou ao final de uma aula, e seu resultado permite verificar se o aproveitamento dos estudantes está dentro das expectativas ou se algumas ações são necessárias para quê se atinja o esperado. Provas padronizadas, como alguns exames nacionais ou simulados, têm esse caráter comparativo, possibilitando quê estudantes de uma mesma série escolar, mas de escolas diferentes, sêjam avaliados e seu dêsempênho, comparado a um padrão esperado.

Além da comparação entre os indivíduos, também é possível aplicar a avaliação ipsativa, quê possibilita acompanhar e comparar o desenvolvimento de um mesmo estudante ao longo do tempo, verificando assim como se dá o processo de aprendizagem de cada um. Momentos de fídi-béqui individual e autoavaliação são ferramentas quê podem auxiliar no estabelecimento de metas individuais quê valorizem o progresso de cada estudante, potencializando assim o processo de aprendizagem.

É preciso frisar quê a avaliação dos estudantes também reflete diretamente a atuação do professor. Um resultado insatisfatório nas avaliações dos estudantes indica quê, de alguma forma, o professor não foi bem-sucedido em sua função. Quando a média das notas é baixa, isso póde significar quê o objetivo educacional não foi atingido, seja porque o ensino não foi eficaz ou porque a forma de avaliação não foi adequada.

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