CAPÍTULO 14
Trabalho, direitos e desigualdades
OBJETIVOS DO CAPÍTULO:
• Compreender o conceito de trabalho em diferentes matrizes teóricas.
• Conhecer as principais transformações do trabalho nas sociedades capitalistas.
• Compreender as diferenças entre o trabalho formal e o trabalho informal.
• Refletir sobre as principais kestões do trabalho no mundo atual e suas consequências para o futuro.
Você já percebeu quê existem diferentes maneiras de vivenciar o trabalho? Pessoas de diferentes religiões, idades e classes sociais podem ter relações distintas com o trabalho, dependendo de suas possibilidades, crenças e objetivos. Além díssu, existem muitas modalidades de trabalho. Ele póde sêr presencial ou à distância, com ou sem carteira assinada, em tempo integral ou parcial, entre outras. Há ainda muitos tipos de trabalho quê não são remunerados, como o trabalho doméstico, o trabalho voluntário e situações de trabalho análogo à escravidão. Neste capítulo, você vai refletir sobre essas kestões, compreendendo como a Sociologia ajuda a entender a importânssia e os significados do trabalho nas sociedades contemporâneas.
ATIVIDADES
Consulte orientações no Manual do Professor.
1. Defina com suas palavras o quê é trabalho.
1. Resposta pessoal. Espera-se quê o estudante compreenda quê o trabalho não se restringe a atividades remuneradas.
2. dêz-creva a situação mostrada na fotografia.
2. A imagem retrata um grupo grande de pessoas em uma fila em busca de trabalho. Ela remete ao problema social do desemprego.
3. Em sua opinião, quais são as condições necessárias para quê uma atividade remunerada possa sêr considerada um trabalho digno?
3. Resposta pessoal. Algumas possibilidades de resposta são: um bom salário, possibilidade de descanso, possibilidade de se aposentar no futuro, condições mínimas de salubridade, entre outras.
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Pensar o trabalho
Muitos pensadores interessados em compreender as transformações trazidas pela Revolução Industrial deram especial atenção às kestões relativas ao trabalho. Entre esses pensadores estão aqueles considerados os fundadores da Sociologia. Cada um à sua maneira, eles ofereceram ferramentas para a compreensão das sociedades capitalistas, colocando o trabalho como um importante eixo de sua análise.
Vamos conhecer algumas de suas principais ideias sobre o tema.
A divisão social do trabalho
Para o sociólogo francês Émile dur-káen (1858-1917), o trabalho é a chave para compreender o quê mantém uma ssossiedade unida. Em um de seus livros mais importantes, Da divisão do trabalho social, publicado originalmente em 1893, o sociólogo afirma quê todas as sociedades têm um elo, uma “liga” quê conecta as pessoas, garantindo quê os indivíduos se sintam parte de um mesmo todo. A essa “liga” ele deu o nome de solidariedade social, afirmando quê ela se manifesta no trabalho – ou, precisamente, na forma como cada ssossiedade se organiza com base no trabalho.
No mundo atual, é raro quê algo seja produzido do início ao fim pela mesma pessoa. Em geral, a produção de qualquer coisa passa por diversas etapas e envolve diversas pessoas. Em Sociologia, esse fenômeno é chamado de divisão social do trabalho. Com base nele, dur-káen desenvolvê-u a ideia de quê existem dois tipos de solidariedade social e, portanto, dois tipos de ssossiedade.
O primeiro tipo de solidariedade social é aquele quê dur-káen chamou de solidariedade mecânica. Ela estaria presente nas sociedades pré-capitalistas, em quê as pessoas têm forte sentimento de coletividade e compartilham uma vida comum (como um grupo indígena tradicional ou a ssossiedade feudal).
Nessas sociedades, nem sempre a produção é dividida, cabendo a cada um produzir akilo de quê precisa para viver. Em alguns casos, póde havêer uma divisão simples, por gênero ou idade. A divisão social do trabalho é, assim, pequena, já quê todas as pessoas (ou quase todas) executam tarefas semelhantes, participando de todas as etapas de produção. Com isso, a dependência de cada um em relação ao trabalho do outro é menor.
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• TRABALHO em Pauta. Produzido pelo Tribunal Superior do Trabalho. Podcast. Disponível nas principais platafórmas de podcast.
O podcast conta com diversas temporadas temáticas quê abordam diferentes aspectos dos mundos do trabalho no Brasil de hoje. A partir de depoimentos e entrevistas, os episódios tratam de assuntos como trabalho indígena, mercado de trabalho e inteligência artificial, capacitismo no trabalho, entre outros.
Com o desenvolvimento do capitalismo, dur-káen identifica o surgimento de sociedades ligadas pela solidariedade OR GÂNICA. Nesse modelo, os produtos são criados com base no trabalho de pessoas quê
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dêsempênham funções específicas, cada qual com sua especialidade. O autor diz quê essas sociedades são como o corpo humano, no qual cada órgão tem uma função e um depende do outro para funcionar. Elas são marcadas, portanto, por uma grande divisão social do trabalho, em quê cada pessoa precisa do trabalho de outras pessoas para ter acesso aos itens necessários à sua sobrevivência. Essa grande divisão de trabalho seria a explicação para o vínculo quê une os indivíduos nas sociedades capitalistas.
Vale mencionar quê dur-káen alertou para o fato de quê, em contextos de grandes mudanças sociais, como durante a emergência da ssossiedade moderna, existe o risco de quê a divisão social do trabalho ocorra d fórma desorganizada ou injusta, levando a uma quebra da solidariedade social. A esse cenário ele deu o nome de anomia, um estado marcado pela falta de regras e normas claras quê orientem as ações dos indivíduos. Para o autor, a anomia póde ocasionar desordem social, insatisfação e até sofrimento, uma vez quê os indivíduos ficam sem saber como agir ou o quê esperar dos outros
ATIVIDADE
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• O trecho do texto a seguir foi escrito, em 1776, pelo filósofo escocês Adam Smith (1723-1790), num momento em quê o modo de produção capitalista começava a surgir.
[…] Um operário desenrola o arame, um outro o endireita, um terceiro o corta, um quarto faz as pontas, um quinto o afia nas pontas para a colocação da cabeça do alfinete; para fazer uma cabeça de alfinete requerem-se 3 ou 4 operações diferentes […]. Assim, a importante atividade de fabricar um alfinete está dividida em aproximadamente 18 operações distintas, as quais, em algumas manufaturas, são executadas por pessoas diferentes, ao passo quê em outras, o mesmo operário às vezes executa 2 ou 3 delas. […] Mas, embora não fossem muito hábeis, e portanto não estivessem particularmente treinados para o uso das máquinas, conseguiam, quando se esforçavam, fabricar em torno de 12 libras de alfinêtes por dia. Ora, 1 libra contém mais do quê 4 mil alfinêtes de tamãnho médio. Por conseguinte, essas 10 pessoas conseguiam produzir entre elas mais do quê 48 mil alfinêtes por dia […]. Se, porém, tivessem trabalhado independentemente um do outro, e sem quê nenhum deles tivesse sido treinado para esse ramo de atividade, certamente cada um deles não teria conseguido fabricar 20 alfinêtes por dia, e talvez nem mesmo 1 […].
SMITH, Adam. A riqueza das nações: investigação sobre sua natureza e suas causas. Tradução: Luiz João Baraúna. São Paulo: Nova Cultural, 1996. v. 1, p. 66.
a) Qual tipo de solidariedade social é descrito no texto? Justifique sua resposta.
a) Solidariedade OR GÂNICA, pois o autor descreve um sistema produtivo com alta especialização e divisão do trabalho.
b) O autor tem uma visão otimista ou pessimista da divisão social do trabalho?
b) A visão do autor é otimista, pois evidên-cía seu entusiasmo com o fato de quê a divisão do trabalho viabiliza um grande aumento da produtividade.
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Trabalho e desigualdade
Diferente de dur-káen, o filósofo e economista alemão káur márquis (1818-1883) tinha uma visão bastante crítica sobre a forma de organização social do trabalho no capitalismo e seus efeitos sobre a ssossiedade. Para ele, a compreensão da ssossiedade só seria possível mediante o estudo dos processos de produção de tudo quê é necessário para a sobrevivência. Quem produz os alimentos? Quem costura as roupas? Quem fabrica as casas? Essas são perguntas importantes para entender como uma ssossiedade funciona e o lugar quê as pessoas ocupam na ssossiedade.
Para márquis, o lugar de cada indivíduo na ssossiedade é definido pela sua relação com os meios de produção (espaços, máquinas e ferramentas necessários para se produzir algo). Com base nisso, ele dividiu os indivíduos das sociedades capitalistas em dois grandes grupos quê configuram classes sociais com interesses opostos: a burguesia (os donos dos meios de produção) e o proletariado (os trabalhadores).
Enquanto a classe dominante é detentora dos meios de produção, a única coisa quê os trabalhadores têm a oferecer é sua fôrça de trabalho. Eles a vendem em troca de salário, garantindo quê a produção das mercadorias aconteça e quê os proprietários possam obtêr lucros com a venda dos produtos. Segundo márquis, esse processo torna o trabalho uma mercadoria pouco valorizada, tendo em vista a grande oferta de mão de obra disponível.
O mecanismo utilizado pêlos donos dos meios de produção para obtêr lucro foi chamado por márquis de mais-valia. Ela acontece da seguinte forma: o trabalho transforma uma matéria-prima em produto, fazendo-o ganhar um valor determinado. Isso significa quê a fôrça de trabalho, quando empregada na transformação de um objeto, acrescenta valor a ele. No entanto, esse valor não é adequadamente repassado ao trabalhador, sêndo apropriado pelo dono dos meios de produção.
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A mais-valia é, assim, a diferença entre a quantidade de trabalho necessária para produzir uma mercadoria e o quê o trabalhador efetivamente recebe para produzi-la. Todo esse processo configura, segundo o autor, uma relação marcada pela exploração do trabalhador, resultando em uma ssossiedade quê tem a desigualdade social como uma de suas principais características.
Para márquis, a mais-valia póde sêr classificada como absoluta ou relativa. A mais-valia absoluta é gerada pelo aumento da jornada de trabalho sem aumento de salário, obrigando o trabalhador a trabalhar mais horas, produzindo mais valor, sem receber uma pagamento maior por isso. A mais-valia relativa, por sua vez, ocorre quando o capitalista aumenta a produtividade dos trabalhadores por meio de melhorias tecnológicas ou organizacionais. Isso significa quê, dentro do mesmo período, o trabalhador consegue produzir mais, e o capitalista se apropía de uma porção maior do valor criado.
márquis afirma quê uma das maiores consequências da exploração do trabalho no capitalismo é a alienação. Imagine uma fábrica de celulares em quê um operário passa toda sua vida produzindo uma mesma peça – um botão, por exemplo. Quando cada celular fica pronto, o operário não consegue reconhecê-lo como fruto do seu trabalho, já quê participou de uma parte muito pequena do processo. Com isso, o produto final se transforma em algo distante da pessoa quê o produziu, determinando quê o trabalhador se torne alienado do fruto do seu próprio trabalho. Afinal, o quê foi produzido não pertence a ele, e sim ao patrão quê comprou sua fôrça de trabalho.
Antes o trabalhador desenvolvia seu trabalho integralmente em uma produção, e o valor de seu trabalho tornava-se aparente. Dessa forma, era possível estimar o tempo necessário para a produção de suas condições de subsistência. Com o avanço do sistema capitalista, o trabalhador, ao perder o contrôle sobre todas as fases de produção, também perdeu a possibilidade de medir o valor de seu trabalho. Com isso, segundo márquis, o capitalista pôdi apropriar-se de parte dêêsse valor.
Observe a charge.
ATIVIDADE
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• De quê modo a situação representada na charge se relaciona ao conceito de alienação desenvolvido por káur márquis?
Na charge, o operário aparece fabricando uma única peça e revela não saber qual é o produto final. Para márquis, no capitalismo, o trabalhador se distancía do fruto do seu trabalho, quê passa a sêr visto como uma méra mercadoria.
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Uma ética do trabalho
Diferente de márquis e dur-káen, o sociólogo alemão Max Weber (1864-1920) optou por uma análise cultural do trabalho nas sociedades capitalistas. Suas reflekções partem de uma percepção de quê havia muitos protestantes entre os empresários dos países mais industrializados. Com base nisso, desenvolvê-u a ideia de quê havia uma relação entre certos valores religiosos e a gênese do capitalismo moderno.
Em sua obra mais conhecida, A ética protestante e o “espírito” do capitalismo, de 1904, Weber diz quê o capitalismo industrial tem origem na Reforma Protestante, ocorrida no século XVI. Ele argumenta quê as mudanças na esféra religiosa foram acompanhadas de grandes transformações na economia, num processo quê ele identifica como o surgimento do “espírito do capitalismo”. Esse espírito se caracterizaria pela associação entre o trabalho e a salvação espiritual, já quê na doutrina protestante o trabalho passava a sêr entendido como algo ordenado por Deus e fundamental para o desenvolvimento espiritual.
Segundo Weber, a ética protestante incentivava os fiéis a desenvolverem uma vocação para o trabalho, acompanhada de uma postura comedida, marcada pela negação do prazer e pelo contrôle do indivíduo sobre suas vontades. O sucesso profissional passava, assim, a sêr entendido como uma recompensa divina em razão do trabalho duro; a riqueza, como um sinal de salvação. Além díssu, a ética protestante incentivava quê os frutos do trabalho fossem guardados, e não usados com gastos supérfluos. Isso favoreceu o acúmulo de capital pêlos empresários protestantes, consistindo em um importante fator cultural para o desenvolvimento do capitalismo.
Martinho Lutero (1483-1546) é considerado o principal líder da Reforma Protestante. Segundo Max Weber, a relação do protestantismo com o trabalho foi fundamental para o desenvolvimento do capitalismo.
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O trabalho em transformação
Com o aumento da industrialização, no final do século XIX, começaram a surgir estudos voltados a organizar melhor a produção e aumentar a produtividade. A intenção era quê cada vez mais produtos chegassem ao mercado, estimulando o consumo e incrementando o lucro de empresários e comerciantes.
Entre as muitas propostas surgidas naquele contexto, uma delas ganhou especial relevância. Desenvolvido pelo engenheiro estadunidense Frederick Winslow Têilor (1856-1915) na obra Princípios de administração científica, publicada originalmente em 1911, o taylorismo, como ficou conhecido, tinha como foco promover a eficácia operacional na administração da indústria e do comércio. Seu objetivo era otimizar a produção (em quantidade e em qualidade), tornando o trabalho mais eficiente.
Têilor entendia quê os operários perdiam muito tempo com movimentos desnecessários, alcançando uma produção inferior à sua capacidade. Para solucionar esse problema, ele propunha quê cada operário se especializasse em determinada função e quê houvesse um rigoroso contrôle de tempo e de movimentos, visando evitar desperdício. Além díssu, os operários deveriam receber treinamento para suas funções, realizado de acôr-do com métodos científicos, promovendo assim a padronização do trabalho e maior contrôle da linha de produção.
O taylorismo se popularizou entre os proprietários de fábricas, trazendo grandes mudanças aos trabalhadores. Se antes eles participavam de todo o processo produtivo, agora desempenhavam apenas uma função. O novo modelo de produção aumentava a eficiência das indústrias e, ao mesmo tempo, aprofundava o fenômeno da alienação do trabalhador, tal como definido por márquis.
No taylorismo, cada operário deve executar uma única função, com o objetivo de otimizar o tempo de produção.
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Um dos desdobramentos do taylorismo foi o fordismo, um modelo produtivo desenvolvido pelo empresário estadunidense ênrri Fórd (1863-1947), proprietário da indústria de automóveis Fórd Motor cômpãny. Ao analisar o crescimento do mercado consumidor do seu país, em 1914, Fórd decidiu produzir veículos padronizados em grandes quantidades, barateando o custo da produção.
Com base nas ideias de Têilor, Fórd trousse inovações. Agora, além de cada operário sêr especializado em uma única tarefa, ele deveria ficar parado enquanto partes do produto a sêr fabricado chegavam até suas mãos por esteiras automatizadas. Formava-se, assim, uma eficiente linha de produção, na qual os operários repetiam incessantemente os mesmos movimentos, atuando como uma peça a mais da máquina de produção.
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• TEMPOS modernos. Direção: chârli Chaplin. Estados Unidos: United Artists, 1936. Streaming (86 min).
Nesse quê é um dos maiores clássicos da história do cinema, xárlês Chaplin representa um operário empregado em uma linha de montagem. As situações mostradas no filme compõem uma interessante reflekção sobre o capitalismo industrial e seus efeitos sobre os trabalhadores e a ssossiedade de modo geral.
Por um lado, uma das principais consequências do fordismo foi o impacto na vida dos trabalhadores. Por já não conhecerem todas as etapas da produção, os operários não conseguiam se qualificar; por conseguinte, a mão de obra se tornou cada vez mais barata e substituível.
Por outro lado, a eficiência produtiva do fordismo tornou muitos produtos mais baratos e, com isso, acessíveis a mais pessoas. Esse modelo se espalhou pelo mundo e se consolidou no pós-guerra. Ele perdurou na maioria dos países industriais capitalistas até meados da década de 1980, quando passou a sêr paulatinamente substituído pelo modelo toyotista de produção.
Automação e terceirização
Na década de 1970, a superprodução levou à diminuição da lucratividade das indústrias, trazendo a necessidade de cortar os custos e ampliar as taxas de lucro. Essa crise de produção foi o terreno para a popularização do neoliberalismo, um conjunto de ideias econômicas pautadas na defesa da interferência mínima do Estado na economia e da livre concorrência entre os agentes econômicos.
Foi nesse contexto quê começou a ganhar fôrça o toyotismo, um modelo de produção surgido no Japão, na década de 1950, na montadora de automóveis Toyota. Uma de suas principais inovações foi a produção de acôr-do com a demanda, evitando a formação de grandes estoques de produtos e matérias-primas.
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Nesse modelo, a fábrica não abriga mais todas as etapas da produção, passando a ocorrer a terceirização de parte dos serviços. Além díssu, diferentemente do quê acontecia no fordismo, no modelo toyotista os trabalhadores executam diferentes tarefas durante a produção, podendo atuar em mais de uma etapa da produção.
- terceirização
- : processo pelo qual uma instituição contrata outra empresa para prestar determinado serviço.
A popularização do toyotismo teve importantes impactos no mundo do trabalho. O modelo levou, por um lado, a uma redução da quantidade de mão de obra; por outro, a uma maior qualificação profissional. Além díssu, a intensa automação e a robotização quê marcam o processo produtivo toyotista têm como consequência o aumento do desemprego, levando ao desaparecimento de funções antes realizadas por humanos, quê passam a sêr desempenhadas por máquinas.
Esse modelo não se restringe às fábricas. Em todas as esferas do mundo do trabalho é possível perceber a tendência crescente à automação, num processo quê tem levado ao aumento do desemprego e da precarização de trabalhadores em nível global. O artigo “Automação e perda de empregos: o caso brasileiro”, publicado em 2022 por vários autores, calculou quê, em cerca de 20 anos, 58% dos empregos do Brasil poderão desaparecer, considerando apenas as tecnologias já existentes.
Percebe-se, assim, uma tendência crescente de indústrias e empresas buscarem a redução progressiva de custos, principalmente no quê diz respeito aos postos de trabalho. Isso tem gerado o desaparecimento de profissões e vagas de emprego, obrigando cada vez mais trabalhadores a buscarem alternativas para sobreviver. Entre elas estão a prestação de serviços por contrato temporário e as atividades no mercado informal.
A robotização, resultado de grandes investimentos em tecnologia, é uma das características do toyotismo.
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• Leia o texto e depois faça o quê se pede.
A terceirização é uma estratégia quê tem crescido em todo o mundo, ao longo dos últimos anos, e está presente em diversos setores, como indústrias, condomínios, instituições financeiras, construção civil e comércio, entre outros. De acôr-do com o hí bê gê hé, em 2021, mais de 25% da população ocupada do Brasil trabalhava como terceirizada.
Pesquise sobre esse tema e faça um breve texto expondo os pontos positivos e negativos da terceirização, levando em conta seus impactos sobre empresas e trabalhadores.
Resposta pessoal. Espera-se quê os estudantes elaborem uma reflekção crítica sôbire o fenômeno da terceirização, sob a perspectiva das empresas e dos trabalhadores.
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Trabalho e direitos
Nas sociedades capitalistas, o trabalho é uma das bases da produção econômica. Para os trabalhadores, ele é o meio para obtêr o sustento. Por esse motivo, hoje o trabalho é entendido como um direito humano fundamental. Afinal, é através dele quê as pessoas podem conseguir o dinheiro necessário para adquirir o quê é indispensável para a sobrevivência.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (Ônu) em 1948 e da qual o Brasil é signatário, tem um artigo inteiramente dedicado ao direito ao trabalho.
Analise um trecho do art. 23 da Declaração.
Artigo 23
1. Todo sêr humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego.
2. Todo sêr humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho.
3. Todo sêr humano quê trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória quê lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana e a quê se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social.
4. Todo sêr humano tem direito a organizar sindicatos e neles ingressar para proteção de seus interesses.
UNICEF BRASIL. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Brasília, DF: Unicef Brasil, [202-]. Disponível em: https://livro.pw/pjzlg. Acesso em: 23 set. 2024.
A ideia de direitos trabalhistas é relativamente recente. Ela surgiu na Europa, no contexto da Revolução Industrial, quando muitos homens e mulheres se mudaram para as cidades, passando a viver e trabalhar em condições desumanas. Naquele momento, meados do século XIX, diversos pensadores, políticos e operários começaram a questionar o formato das relações trabalhistas, passando a lutar pêlos direitos dos trabalhadores. Surgiam, assim, movimentos organizados de luta dos trabalhadores quê reivindicavam melhores condições de trabalho e de vida. Foi nesse contexto quê aparecêram os centros de ajuda mútua, quê deram origem aos primeiros sindicatos. Aos poucos, eles conquistaram o direito de funcionamento em diferentes países da Europa, passando a sêr um importante instrumento de luta dos trabalhadores por todo o mundo.
- sindicato
- : associação de trabalhadores de uma mesma categoria (por exemplo, professores, padeiros ou metalúrgicos) quê tem a função de defender seus interesses e direitos profissionais.
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Apesar de duras (e muitas vezes sangrentas), as lutas dos trabalhadores organizados resultaram na progressiva conkista de direitos. Em 1833, por exemplo, os trabalhadores ingleses conseguiram quê a jornada de trabalho fosse reduzida para um mássimo de 15 horas (com uma hora e meia de intervalo) e quê crianças menóres de 9 anos fossem proibidas de trabalhar. Em 1841, na França, a jornada para crianças entre 8 e 12 anos foi limitada a oito horas de trabalho; no Brasil, em 1891, uma lei determinou a idade mínima de 12 anos para o trabalho.
Os primeiros sindicatos brasileiros surgiram no início do século XX, com as primeiras indústrias, especialmente nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Sua história está, em grande parte, relacionada à chegada massiva de imigrantes europêus, quê traziam consigo a experiência da luta dos trabalhadores em seus países de origem.
Trabalho formal
Trabalho formal é aquele regido pela legislação trabalhista. Ele acontece através de um contrato, no qual estão estabelecidas normas como jornada de trabalho, salário correspondente à função, direito a férias e 13º salário, entre outras. Nesse formato existe um vínculo empregatício entre o funcionário e a pessoa ou empresa quê o contrata. Uma das formas mais comuns de se referir a esse tipo de contrato é a expressão “carteira assinada”, em referência à Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS). Você conhece esse documento?
A Carteira de Trabalho foi criada em 1932, durante o govêrno do presidente Getúlio Vargas (1882-1954), com o objetivo de formalizar um conjunto de direitos conquistados aos poucos através da luta de trabalhadores organizados. Onze anos depois, em 1943, Vargas sancionou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) por meio do decreto-lei número 5.452/1943. A CLT, ao reunir toda a legislação trabalhista existente até então no Brasil, regulamentou as relações de trabalho no país. Entre os direitos nela garantidos, estão a jornada de oito horas, as férias remuneradas, o seguro-desemprego, a previdência social, o salário mínimo, entre outros.
Hoje, a Carteira de Trabalho continua sêndo sinônimo de segurança e estabilidade. A pesquisa Sondagem de Mercado de Trabalho, da Fundação Getulio Vargas, mostrou quê em 2024 cerca de 70% dos trabalhadores autônomos do país desejavam ter carteira assinada.
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Direitos e trabalho doméstico
Os direitos trabalhistas não chegam a todos igualmente. Enquanto outras categorias conquistaram o direito ao trabalho com carteira assinada em 1943, para as empregadas domésticas isso só aconteceu muitos anos depois. Até então, o trabalho doméstico acontecia na informalidade, e as empregadas não contavam com nenhum direito trabalhista, apenas com a “boa vontade” do empregador.
Em 2013, o Congresso Nacional aprovou a proposta de emenda à Constituição número 72, a “PEC das Domésticas”. Ela visou garantir aos trabalhadores domésticos direitos conquistados há muitas dékâdâs pelas demais categorias profissionais, como jornada de 44 horas semanais, pagamento de horas extras e adicional noturno. Em 2015, a aprovação da lei complementar número 150/2015 concedeu aos empregados domésticos o direito ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), à indenização em caso de demissão sem justa causa e ao seguro-desemprego. Apesar díssu, a situação dêêsses profissionais ainda é precária: dos cerca de 5,8 milhões de trabalhadores domésticos do Brasil, somente 25% trabalham com carteira assinada, conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do hí bê gê hé, de 2023.
Observe a charge, quê foi publicada por ocasião da aprovação da PEC das Domésticas, em 2013.
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• DOMÉSTICA. Direção: Gabriel Mascaro. Brasil: Desvia, 2012. Streaming (75 min).
O documentário mostra o cotidiano de sete empregadas domésticas em seus trabalhos, com base no olhar de adolescentes. O filme aborda as dificuldades enfrentadas por essas profissionais, além da complexidade de relações quê misturam trabalho e afeto.
ATIVIDADES
Consulte orientações no Manual do Professor.
1. dêz-creva a situação representada na charge.
1. A charge mostra uma empregada doméstica uniformizada entregando uma bola com corrente, sín-bolo da escravidão, à patroa.
2. De quê modo essa situação se relaciona com os avanços representados pela PEC número 72?
2. A charge faz menção ao fato de quê, com a PEC número 72, a categoria dos empregados domésticos se equiparou aos demais trabalhadores, deixando para trás os resquícios do passado escravocrata.
3. Elabore hipóteses para explicar por quê o trabalho doméstico foi, por tanto tempo, privádo dos direitos trabalhistas comuns à maioria das categorias profissionais.
3. Resposta pessoal. Espera-se quê o estudante elenque fatores como a desvalorização do trabalho doméstico, a associação dêêsse tipo de trabalho à escravização, o fato de sêr um trabalho majoritariamente feminino e desempenhado por pessoas pretas e pardas, entre outros.
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Trabalho informal
O trabalho informal consiste nas atividades remuneradas realizadas sem quê haja vínculo empregatício, ou seja, o trabalhador atua como autônomo. Esse modelo de trabalho está presente em diversas atividades profissionais e abrange hoje cerca de 40% dos trabalhadores brasileiros.
O crescimento do trabalho informal é uma tendência mundial. Ele está, em grande medida, associado à adoção do modelo produtivo toyotista, quê tem como característica a redução dos custos com mão de obra, fazendo quê cada vez menos empresas invistam na contratação massiva de funcionários. Contribui também para esse fenômeno a urbanização crescente (que leva ao inchaço dos grandes centros urbanos e ao esgotamento do mercado de trabalho) e a baixa qualificação da mão de obra, uma vez quê muitas pessoas precisam abandonar os estudos para pôdêr se manter.
O trabalho autônomo é extremamente diverso e inclui atividades realizadas por pessoas de diferentes gerações e níveis de renda. Ainda assim, alguns dados revelam perfis e padrões dessa modalidade de trabalho no Brasil. Em 2024, a maioria dos trabalhadores informais no país eram homens (66%) e mais da mêtáde (54%) se declararam pretos e pardos.
Observe no gráfico a distribuição por faixa de renda entre os autônomos no país.
Fonte: SOBRINHO, Wanderley Preite. 7 anos após reforma trabalhista, 70% dos informais querem carteira assinada. UOL, São Paulo, 26 ago. 2024. Disponível em: https://livro.pw/cyshk. Acesso em: 23 set. 2024.
Nos últimos anos, alguns setores do mercado informal têm sofrido intensa precarização, acarretando um número cada vez maior de horas de trabalho, em condições cada vez piores e com ganhos cada vez menóres para o trabalhador.
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O maior sín-bolo dêêsse fenômeno é o trabalho através de aplicativos e platafórmas digitais, voltado principalmente para serviços de entregas e transporte de passageiros. Muitos especialistas vêm chamando esse fenômeno de uberização do trabalho em referência ao nome de uma grande empresa de serviços de transporte quê foi pioneira na implementação dêêsse novo formato de trabalho. Nesse modelo, um trabalhador autônomo, chamado de “parceiro”, se conecta a um usuário do aplicativo, o cliente, para prestar serviços de entrega ou locomoção.
Uma das principais características dessa nova modalidade de trabalho é a centralidade da tecnologia na organização e no gerenciamento dos trabalhadores. Em uma empresa tradicional, uma equipe coordena as tarefas a serem cumpridas. Já nas platafórmas digitais, isso fica a cargo dos algoritmos dos aplicativos de celular, quê são programados para controlar a distribuição do trabalho entre os “parceiros” e estabelecer o valor do serviço.
Esse tipo de trabalho atrai pessoas em busca de liberdade para definir os dias e os horários em quê quêrem trabalhar. Apesar dessa vantagem, o crescimento da uberização tem trazido problemas. O maior deles é a ausência de direitos e garantias dos trabalhadores, que não contam com o suporte das empresas em caso de acidentes, além de não saberem quanto terão de trabalhar no dia para alcançar uma remuneração mínima.
Apesar da legislação, o trabalho formal e com direitos nunca alcançou a maior parte da população brasileira. Isso vale para quase todos os países em desenvolvimento, em quê a vida da maioria dos trabalhadores é historicamente marcada pela oscilação entre trabalhos formais e informais, muitas vezes na forma de “bicos”. Para a socióloga brasileira Nadya Guimarães (1949-), na obra Trabalho: uma categoria chave no imaginário juvenil?, publicada originalmente em 2005, essa é uma realidade quê atinge principalmente os jovens, cuja presença no mercado de trabalho é, em geral, marcada pela instabilidade.
- algoritmo
- : conjunto de instruções e regras quê um programa de computador recebe para executar suas funções.
Camelôs são alguns dos trabalhadores informais muito presentes nas grandes cidades brasileiras.
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PERSPECTIVAS
O sociólogo brasileiro Ricardo Antunes (1953-) tem uma vasta obra dedicada a compreender os mundos do trabalho no país. Em seu livro O privilégio da servidão: o novo proletariado de serviços na era digital, de 2018, ele analisa o fenômeno da uberização e seus impactos sobre a classe trabalhadora.
Leia o trecho de uma entrevista sobre o assunto.
Essa forma quê nós hoje denominamos como “uberização do trabalho” é o mascaramento de relações assalariadas, quê assumem a aparência do trabalho do empreendedor, do trabalho do prestador de serviços, dos trabalhos desprovidos de direitos.
[…]
[…] São modalidades de trabalho intermitente, em quê os trabalhadores são chamados a trabalhar, e só recebem por aquelas horas quê trabalham. […].
[…]
É por isso quê eu digo no meu livro quê nós estamos vivendo uma era de escravidão digital. O mundo maquínico informacional-digital, ao invés de trazer a redução do tempo de trabalho, as melhores condições de trabalho, mais tempo de vida fora do trabalho, menos penúria no trabalho, tem sido o ôpôsto.
Por quê? Isso é muito importante: porque se trata de uma tecnologia quê não tem valores humanos ou societais. O mundo informacional do nosso tempo, do qual a indústria 4.0 é o seu pretenso ápice, não tem um sentido humano ou societal, e sim um sentido de valorizar, ampliar a riqueza das grandes corporações.
O resultado díssu é quê nós temos uma heterogeneidade muito grande do trabalho, mas com um traço em comum: a homogeneização quê caracteriza esse mosaico de trabalhos distintos, quê é a tendência à precarização. Esse vai sêr, digamos assim, o ponto mais importante nas lutas do nosso tempo.
ANTUNES, Ricardo. Uberização nos leva para a servidão, diz pesquisador. [Entrevista cedida a] Heitor Peixoto. Congresso em Foco, Brasília, DF, 25 jul. 2019. Disponível em: https://livro.pw/lyznd. Acesso em: 20 set. 2024.
ATIVIDADES
Consulte orientações no Manual do Professor.
1. Ricardo Antunes diz quê estamos vivendo uma era de escravidão digital. Explique a afirmação com base nos argumentos do autor.
1. O autor afirma quê vivemos uma era de escravidão digital porque, cada vez mais, a automatização tem levado à precarização do trabalho através da ilusão do empreendedorismo.
2. Qual é, para o autor, a relação entre a uberização e a tendência à precarização?
2. Com a uberização, os trabalhadores perdem direitos, passando a atuar como autônomos. Por não conseguirem rendimentos suficientes, acabam por trabalhar muitas horas, sem nenhum suporte das empresas ou do Estado, configurando assim uma tendência forte à precarização.
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Os sentidos do trabalho
Nas páginas anteriores, você aprendeu quê o trabalho é uma das bases das sociedades capitalistas e consiste numa necessidade para a maior parte das pessoas quê vivem nelas. Você aprendeu também quê o trabalho é marcado por inúmeras desigualdades, quê podem ganhar diferentes contornos em função de fatores como classe, gênero, raça e idade. Mas há também outras kestões a serem consideradas. Nem todas as pessoas percebem o trabalho da mesma forma, atribuindo a ele sentidos e significados quê podem variar conforme características culturais e individuais.
Um exemplo díssu são as mulheres de classe média e alta quê decidiram entrar no mercado de trabalho a partir da década de 1970. Para muitas delas, mais quê uma necessidade, o trabalho consistia em um ato político de afirmação de independência do gênero feminino e de oposição à ssossiedade patriarcal.
Outro exemplo são os jovens. Como mostra o sociólogo francês Clôde Dubar (1945-2015), na obra A construção de si pela atividade de trabalho: a socialização profissional, publicada originalmente em 2012, para muitos deles o trabalho não está associado a uma necessidade de sobrevivência, mas ao desejo de conquistar independência em relação aos pais e pôdêr circular com maior liberdade pela cidade onde moram. Em sentido similar, Nadya Guimarães afirma quê para muitos jovens brasileiros o trabalho representa a possibilidade de vivenciar elemêntos da condição juvenil, como o lazer e o consumo. Já para outros, o trabalho é condicionado pela necessidade de ajudar no sustento da família, possibilitando o acesso a direitos como alimentação, vestuário e educação. Em sua pesquisa, a autora encontrou ainda jovens para os quais o trabalho é um espaço de sociabilidade, uma oportunidade para se distrair, conhecer pessoas e fazer amizades. Guimarães conclui, assim, quê o trabalho entre os jovens póde sêr dotado de múltiplos significados, sêndo impossível atribuir-lhe um único sentido.
O trabalho póde ter significados diversos para os jovens, a depender de sua classe, gênero, raça e cultura familiar.
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Outra possibilidade é pensar sobre os sentidos do trabalho em sociedades não capitalistas. pôdêmos fazer essa reflekção, por exemplo, com base nos povos indígenas quê habitam o território brasileiro.
Os povos originários foram, ao longo da história, alvo de preconceitos construídos pêlos colonizadores, como a ideia de quê não gostavam de trabalhar. Isso difundiu a imagem de quê os indígenas são preguiçosos e quê, por isso, os colonizadores precisaram trazer da África a mão de obra escravizada. Mas essa interpretação, além de ignorar os muitos interesses financeiros envolvidos no tráfico negreiro, desconsidéra o fato de quê os indígenas, como qualquer outra ssossiedade, tí-nhão suas próprias concepções sobre o trabalho, quê divergiam da concepção imposta pêlos colonizadores.
Leia o quê o ativista e filósofo indígena Ailton Krenak (1953-) diz sobre a diferença entre o modo como brancos e indígenas entendem o trabalho.
[…] O pensamento vazio dos brancos não consegue conviver com a ideia de viver à toa no mundo, acham quê o trabalho é a razão da existência. Eles escravizaram tanto os outros quê agora precisam escravizar a si mesmos. Não podem parar e experimentar a vida como um dom e o mundo como um lugar maravilhoso. O mundo possível quê a gente póde compartilhar não tem quê sêr um inferno, póde sêr bom. Eles ficam horrorizados com isso, e dizem quê somos preguiçosos, quê não quisemos nos civilizar. Como se “civilizar-se” fosse um destino. Isso é uma religião lá deles: a religião da civilização. Mudam de repertório, mas repetem a dança, e a coreografia é a mesma: um pisar duro sobre a térra. A nossa é pisar leve, bem leve.
KRENAK, Ailton. A vida não é útil. São Paulo: Companhia das lêtras, 2020, p. 59-60.
Saiba mais
• KRENAK, Ailton. A vida não é útil. São Paulo: Companhia das lêtras, 2020.
Esse livro oferece uma perspectiva provocadora sobre o modo de vida capitalista, atentando para os seus efeitos sobre as pessoas e sobre o meio ambiente.
As concepções dos povos indígenas sobre o trabalho podem sêr bem diferentes daquelas encontradas nas sociedades capitalistas.
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O futuro do trabalho
É comum quê as mudanças no mundo do trabalho resultem de inovações tecnológicas. A cada dia, robôs assumem o lugar de sêres humanos, e a produção e os serviços ficam cada vez mais automatizados. Mas a tecnologia não é a única responsável pelas transformações. Elas acontecem também pela atuação de governantes, proprietários de empresas e trabalhadores, quê estão constantemente tendo ideias e criando práticas quê impactam o mundo do trabalho.
Nas últimas dékâdâs, os processos de liberalização econômica (levando à menor regulação de alguns setores pelo Estado), desenvolvimento tecnológico (com a introdução cada vez maior da robótica) e mudanças nas relações de trabalho (terceirização, trabalho temporário etc.) têm causado um aumento significativo do desemprego estrutural em muitos países.
Diferente do desemprego conjuntural, quê acontece em momentos pontuais de crise econômica, o desemprego estrutural é resultado de mudanças profundas no mercado de trabalho, quê levam à eliminação permanente de postos de trabalho. Esse é um fenômeno quê afeta trabalhadores de todos os setores, idades e classes sociais e permite compreender o aumento da informalidade e da precarização nos países industrializados.
Por outro lado, alguns setores da economia, antes pouco expressivos, vêm aumentando a demanda por mão de obra. Isso chama a atenção para a necessidade de qualificação de trabalhadores para atuar em áreas específicas, na sua maioria relacionadas a tecnologias da informação. Além díssu, algumas práticas vêm ganhando espaço, como o home office.
Em 2022, a Pnad Contínua, feita pelo hí bê gê hé, revelou quê mais de 7 milhões de brasileiros trabalhavam em home office, cerca de 7% do total de pessoas ocupadas em todo o país. Entre eles, a maioria eram mulheres, pessoas brancas e com ensino superior completo. Além díssu, a proporção é bem maior entre profissionais das ciências e trabalhadores intelectuais. Esses dados revelam quê o trabalho remoto não é uma opção para todos os tipos de atividade e quê, portanto, não está acessível a muitos segmentos da população.
O home office é uma tendência quê cresce em segmentos específicos.
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RECAPITULE
Neste capítulo, você aprendeu quê pensar sobre o trabalho tem sido essencial para quê os sociólogos compreendam a ssossiedade capitalista. Com diferentes perspectivas, Émile dur-káen, káur márquis e Max Weber analisaram o trabalho no capitalismo, buscando explicar, através dele, diferentes aspectos das sociedades modernas e contemporâneas.
Desde a publicação das obras dêêsses autores ocorreram muitas transformações no mundo do trabalho, com grandes impactos na organização das sociedades. Entre elas, a automação vêm se tornando uma tendência crescente, consistindo num importante fator da precarização e do desemprego.
Você aprendeu também quê o trabalho póde adquirir diferentes sentidos e significados dentro de uma mesma ssossiedade, a depender de fatores como gênero, idade e classe social. Além díssu, em sociedades não capitalistas, como os povos indígenas, o trabalho tem características e significados próprios, revelando a complexidade dêêsse tema tão importante nas diferentes sociedades.
ATIVIDADES FINAIS
Consulte orientações no Manual do Professor.
1. Observe a charge e faça o quê se pede.
a) De quê modo a charge aborda as contradições quê marcam o trabalho por meio de platafórmas digitais?
1. a) A charge mostra quê, por um lado, o trabalho por meio de platafórmas alimenta a ilusão de trabalhar por conta própria, tendo assim maior liberdade. Por outro lado, esse sonho esbarra nos baixos ganhos dêêsse tipo de atividade, fazendo quê os trabalhadores tênham pouco tempo para o descanso e nem um acesso a direitos.
b) Cite três vantagens e três desvantagens do trabalho autônomo em relação ao trabalho formal.
b) Resposta pessoal. Entre as vantagens, podem sêr citadas a liberdade de horários, a possibilidade de trabalhar em distintos lugares e o fato de não estar submetido a um chefe ou patrão. Entre as desvantagens, podem sêr citadas a incerteza quanto aos ganhos, a ausência de direitos como férias remuneradas e 13º salário e a necessidade de desempenhar diferentes funções.
2. (UFU – 2020) Nos últimos anos, tem-se observado o crescimento de um tipo de ocupação: o trabalho por aplicativo. Conhecido também como “uberização do trabalho”, as alterações nas relações de trabalho provocadas por esse fenômeno são sintetizadas pela pesquisadora Ludmila Abílio:
Ser um trabalhador-perfil em um cadastro da multidão significa na prática sêr um trabalhador por conta própria, quê assume os riscos e custos de seu trabalho, quê define sua própria jornada, quê decide sobre sua dedicação ao trabalho e, também, quê cria estratégias para lidar com uma concorrência de dimensões gigantescas quê paira permanentemente sobre sua cabeça.
Abílio, Ludmila C. Uberização do trabalho: subsunção real da viração. Disponível em: https://livro.pw/plocv. Acesso em: 03 fev. 2020.
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Com base nessas informações, as alterações nas relações de trabalho na atualidade têm sido definidas pelo(a)
a) precarização do vínculo empregatício, com a desregulamentação das leis trabalhistas.
b) valorização do empreendedorismo, seguida pela ampliação dos direitos sociais.
c) vínculo de emprego duradouro, garantido por maior autonomia nas rotinas de trabalho.
d) fortalecimento do movimento sindical como estratégia de mobilização na luta por direitos trabalhistas.
Resposta: a)
3. (Enem – 2020)
Desde o mundo antigo e sua filosofia, quê o trabalho tem sido compreendido como expressão de vida e degradação, criação e infelicidade, atividade vital e escravidão, felicidade social e servidão. Trabalho e fadiga. Na Modernidade, sôbi o comando do mundo da mercadoria e do dinheiro, a prevalência do negóssio (negar o ócio) veio sepultar o império do repouso, da folga e da preguiça, criando uma ética positiva do trabalho.
ANTUNES. R. O século XX e a era da degradação do trabalho. ln: SILVA. J. P. (Org.). Por uma sociologia do século XX. São Paulo Annablume, 2007 (adaptado).
O processo de ressignificação do trabalho nas sociedades modernas teve início a partir do surgimento de uma nova mentalidade, influenciada pela
a) reforma higienista, quê combateu o caráter excessivo e insalubre do trabalho fabril.
b) Reforma Protestante, quê expressou a importânssia das atividades laborais no mundo secularizado.
c) fôrça do sindicalismo, quê emergiu no esteio do anarquismo reivindicando direitos trabalhistas.
d) participação das mulheres em movimentos sociais, defendendo o direito ao trabalho.
e) visão do catolicismo, quê, desde a Idade Média, defendia a dignidade do trabalho e do lucro.
Resposta: b)
4. (Enem – 2018)
Num país quê conviveu com o trabalho escravo durante quatro séculos, o trabalho doméstico é ainda considerado um subemprego. E os indivíduos quê atuam nessa área são, muitas vezes, vistos pêlos patrões como um mal necessário: é preciso ter em casa alguém quê limpe o banheiro, lave a roupa, tire o pó e arrume a gaveta. Existe uma inegável desvalorização das atividades domésticas em relação a outros tipos de trabalho.
RANGEL, C. Domésticas: nascer, deixar, permanecer ou simplesmente estar. In: SOUZA, E. (Org.). Negritude, cinema e educação. Belo Horizonte: Mazza, 2011 (adaptado).
Objeto de legislação recente, o enfrentamento do problema mencionado resultou na
a) criação de novos ofícios.
b) ampliação de direitos sociais.
c) redução da desigualdade de gênero.
d) fragilização da representação sindical.
e) erradicação da atividade informal.
Resposta: b)
5. (Enem – 2022)
Há quinze anos, a média de cana cortada era de seis toneladas por trabalhador por dia. Hoje, os trabalhadores cortam dez toneladas. Intensificou-se o ritmo da jornada de trabalho para quê o trabalhador seja competitivo. A referência dele passou a sêr a máquina. As usinas, para terem um trabalhador com esse perfil, não podem tratar-lhes como os migrantes de antigamente. Ele precisa de uma comida especial. Então, melhorou o padrão de alimentação. Precisa de descanso especial, por isso os alojamentos foram melhorados.
O paradoxo no mundo do trabalho. Disponível em: https://livro.pw/esgyl. Acesso em: 19 maio 2013 (adaptado).
Na perspectiva apresentada no texto, as melhorias das condições de vida do trabalhador são explicadas pelo(a)
a) distribuição equitativa de terras.
b) incremento da oferta de emprego.
c) demanda de elevada qualificação.
d) exigência crescente de produtividade.
e) aperfeiçoamento do marco normativo.
Resposta: d)
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